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20 de outubro de 2010

Estado Misto: depressão que não melhora com antidepressivos


Já abordei aqui no blog a respeito dos estados mistos e de sua relação com a bipolaridade, mas decidi dar maior ênfase, pois tenho recebido muitos pacientes em uso de antidepressivos, com diagnóstico prévio de depressão ou ansiedade, mas sem benefício claro do uso prolongado desses medicamentos.

E quem são esses pacientes? Escolhi dois exemplos que marcam bem como esses pacientes chegam para uma primeira consulta:

Exemplo 1– paciente que já fez uso de diversos antidepressivos diferentes (mudou muitas vezes), teve uma melhora inicial, mas depois voltou a ter sintomas. Os sintomas, em geral, são de muito cansaço, vontade de permanecer na cama ou sono durante o dia, desânimo, falta de prazer, enfim, sintomas depressivos, mas também muita ansiedade, na forma de somatização (taquicardia, sudorese, aflição no peito, pânico) ou psicológica (inquietação, agitação, impaciência), pensamentos repetitivos, acelerados ou com muitas idéias ao mesmo tempo, percebidos como uma dificuldade de relaxar ou de desligar a mente, o que também vem acompanhado de insônia à noite, déficit de atenção e memória. Não raro observa-se aumento de apetite e/ou ganho de peso.

Exemplo 2 – paciente que começou um tratamento com antidepressivo, teve melhora inicial, permaneceu com o medicamento, mas depois voltou a sentir sintomas desagradáveis, muitos dos quais não ocorriam antes (sensação de que o “quadro mudou”). Tornou-se mais irritadiço, ansioso, com dificuldade de relacionamento em casa ou no trabalho. A percepção muitas vezes é de que a “depressão” melhorou, mas deu lugar a um estado crônico de mau humor. Os sintomas mencionados no exemplo 1 também são comuns neste caso. A diferença é que esses pacientes “responderam” ao tratamento antidepressivo, mas não conseguem mais viver sem ele, pois mesmo com ele não se sentem 100% (“imagine sem ele”).

Em ambos os casos percebe-se que o tratamento com antidepressivos não foi eficaz, pois não resolveu todos os sintomas, ou pode ser inclusive maléfico, mudando o perfil sintomático do quadro, gerando maior irritabilidade, intolerância ou comportamento explosivo/agressivo.

A dificuldade em identificar esta mudança está no fato de que elas ocorrem lentamente, depois de uma impressão inicial de que a resposta ao antidepressivo foi positiva. Há a tendência de o paciente achar que os sintomas mais ansiosos e irritadiços se devem aos fatores externos e é rara a percepção de que eles estão relacionados ao tratamento ou ao humor.

A grande preocupação é que este quadro pode se cronificar e a pessoa se tornar diferente, com características de temperamento e personalidade que antes não tinha. Sabemos que uma doença psiquiátrica crônica por si só já pode fazer isso, mas uma doença tratada de maneira errada pode tornar este processo ainda mais rápido. Os desgastes sociais e familiares são enormes!

É importante que o psiquiatra saiba identificar os quadros mistos, pois a mudança na forma de tratar pode não só recuperar o paciente de todos os sintomas que sente, como evitar que, a longo prazo, seu problema se torne crônico.

Manuais diagnósticos não dão importância devida

A maior dificuldade hoje é que os manuais diagnósticos atuais (CID-X e DSM-IV) não dão a ênfase necessária a esse problema. A CID-X, por exemplo, só fala em estado misto como um subtipo do transtorno bipolar, mas oferece um diagnóstico de transtorno misto de ansiedade e depressão (F41.2) junto aos demais diagnósticos de ansiedade, cuja a descrição em muito se assemelha aos estados mistos. O transtorno misto de ansiedade e depressão é uma das principais causas de afastamento pelo INSS por motivos psiquiátricos, mas a própria CID-X recomenda que este diagnóstico seja dado aos casos mais leves ou não persistentes, pois os casos mais graves e crônicos deveriam ser classificados como transtorno de humor.

A confusão diagnóstica não pára por aí. Como os estados mistos estão inseridos nos manuais diagnósticos como parte do transtorno bipolar, exige-se para o seu diagnóstico que o paciente tenha, além do episódio depressivo, ao menos um episódio de mania ou hipomania (euforia). Este é justamente o maior dos problemas, já que a grande maioria dos pacientes com estado misto nunca teve e nem terá um episódio de mania ou hipomania. O episódio misto já é, por definição, um estado do humor que mistura os extremos, de um lado a depressão (baixa do humor) e de outro a inquietação ou agitação (elevação do humor).

A ciclotimia, outro diagnóstico que deveria pertencer ao grupo da bipolaridade, foi considerada pelos atuais manuais diagnósticos como um transtorno persistente do humor, enquanto que a maior parte dos ciclotímicos experimenta estados mistos, pois como ciclam ou variam muito rapidamente de humor, os dois estados acabam se sobrepondo.

Os manuais diagnósticos acabam influenciando mais o cotidiano dos psiquiatras e de seus pacientes do que imaginamos. Como existe a dificuldade diagnóstica, protela-se muito o tratamento com os estabilizadores de humor e, por outro lado, pacientes resistem muito à idéia de tomar um estabilizador por rejeitarem a hipótese de possuírem uma forma de transtorno bipolar ou porque não compreendem como um estado predominantemente depressivo deve ser tratado sem antidepressivos ou com a combinação de outros medicamentos.

Isto sem falar da maioria dos pacientes, que estão se tratando com clínicos gerais e outros especialistas que não possuem esta compreensão dos transtornos de humor e não conseguem, portanto, diferenciar um estado misto de um estado depressivo.
As novas versões dos manuais de diagnóstico psiquiátrico precisarão dar conta desta demanda, que hoje pode ultrapassar 60% dos pacientes tratados com antidepressivos, segundo pesquisas recentes.

Pensando no futuro

O tratamento com estabilizadores de humor não só melhora os sintomas desses pacientes, como equilibra o humor ao longo do tempo, permitindo que eles tenham relacionamentos mais positivos em casa e no trabalho, sejam mais eficientes em suas atividades e tenham, portanto, melhor qualidade de vida.

Os sintomas cognitivos são muito comuns nos estados mistos, percebidos como uma falta persistente de concentração, esquecimentos, dificuldade de leitura, lentidão de raciocínio, levando à falta de persistência nas atividades. Estes sintomas podem cronificar da mesma forma que os sintomas do humor e se transformarem num problema maior à medida que a idade avança e o cérebro envelhece.

O estabilizador de humor carbonato de lítio, conhecido como lítio, considerado um dos tratamentos mais eficazes na bipolaridade, tem comprovada ação neuroprotetora, retardando o aparecimento de demências (doenças neurodegenerativas) na terceira idade em pacientes bipolares.

O que parece contribuir muito para o declínio cognitivo é a persistência de sintomas depressivos e ansiosos ao longo da vida, o que infelizmente é mais regra do que exceção nos estados mistos. Por isso a necessidade do tratamento adequado, pois além da melhoria de curto e médio prazo, é fundamental pensarmos preventivamente e zelarmos pela saúde mental dessas pessoas quando estiverem com mais de 60 anos de idade.

Da mesma forma que praticar exercícios e ter uma boa alimentação na idade adulta ajuda prevenir as doenças degenerativas, cuidar da saúde mental e do seu ambiente familiar e de trabalho também é de crucial importância para envelhecer com lucidez!

Os estabilizadores de humor são uma opção segura e eficaz

O tratamento indicado no estado misto é o estabilizador de humor. Esta classe compreende medicamentos com mecanismos de ação diferentes, com indicações também em outras áreas da medicina. Um exemplo comum é dos anti-convulsivantes, medicamentos indicados na epilepsia. Alguns deles, como a lamotrigina, o divalproato de sódio, a oxacarbazepina e a carbamazepina possuem eficácia comprovada na regulação do humor, sendo medicamentos classicamente utilizados no transtorno bipolar.

Outro estabilizador de humor por excelência é o carbonato de lítio, considerado ainda hoje o padrão-ouro, terminologia utilizada na medicina para indicar que um determinado medicamento é a referência no tratamento de uma doença.

Os estabilizadores de humor podem ser utilizados isoladamente, em associação entre eles (p.ex. dois estabilizadores em conjunto) ou em associação com outros medicamentos, como antidepressivos e ansiolíticos. Isto ocorre porque o perfil de ação dos estabilizadores é diferente, uns agindo melhor em sintomas depressivos e outros mais em sintomas como ansiedade, irritabilidade e inquietação. Porém todos têm como objetivo fundamental regular o humor, gerando estabilidade a longo prazo e evitando recaídas.

A dificuldade de alguns pacientes em aceitar o medicamento deve-se ao receio dos efeitos colaterais, em grande parte por se acreditar equivocadamente que medicamentos para epilepsia são “fortes”, podem provocar convulsões ou causam dependência. Pois é justamente o oposto. Os estabilizadores de humor costumam ser mais bem tolerados no início do tratamento, pois não causam os efeitos gastrointestinais comuns entre os antidepressivos, não causam os sintomas na hora de retirá-los ou dependência (sintomas da falta do medicamento, o que é mais comum com os antidepressivos e os ansiolíticos) e não trazem maiores riscos no longo prazo. O fato de alguns serem indicados para o tratamento da epilepsia, visto por muitos de forma preconceituosa, é análogo a se utilizar um anti-convulsivante para a prevenção da enxaqueca ou um diurético para o controle da pressão arterial. Isto é, independente da indicação principal ou classe a qual o medicamento pertença, ele pode ter outras indicações e ser muito eficaz nelas.

Um conceito importante é que o tempo de tratamento deve ser prolongado para que os efeitos reguladores de humor possam ser sentidos claramente. No caso do carbonato de lítio (mais estudado), existem relatos clínicos de melhora progressiva mesmo após 1 ano de uso.

Um estabilizador de humor dificilmente poderá ser avaliado antes de 3 meses de uso, pois neste período ainda se está fazendo ajustes na dosagem. A lamotrigina, por exemplo, só pode ser aumentada a cada 2 semanas, até se atingir a dose terapêutica, que varia entre 100 e 200mg/dia, o que ocorre geralmente após 4 a 8 semanas.

O tratamento deve ser seguido ao longo de alguns anos, pois é importante que o paciente experimente um tempo prolongado de estabilidade. Muitos procuram o tratamento após muitos anos (décadas às vezes) de instabilidade, portanto, é razoável supor que o período de estabilidade deva ser grande o suficiente para que a pessoa se desacostume ao ritmo de vida que levava no passado e passe a tomar medidas para seu próprio bem estar. É isto que conta muito na evolução a longo prazo e, por isso, indicamos a psicoterapia como um acompanhamento necessário. Sem as mudanças de hábitos e de padrões repetitivos de comportamento será muito difícil que um paciente consiga a estabilidade sem os medicamentos.

Na fase de retirada da medicação é importante que o desmame seja o mais lento possível. Em alguns casos podem ser necessários meses ou até um ano para a retirada da medicação. É importante que o paciente seja observado em cada dose intermediária antes que se interrompa definitivamente o tratamento. Este tempo permite a verificação de possíveis oscilações de humor ou padrões de reatividade que com doses mais altas não aconteciam. São pistas úteis ao psiquiatra para avaliar se o paciente de fato manterá a estabilidade sem a medicação. Este é um problema sério para a maioria dos pacientes, que quer resultados rápidos e alta precoce do tratamento.

A psiquiatria possui alguns paradoxos que são difíceis de explicar. Uma pessoa aceita usar uma pílula anticoncepcional por longos anos, que sabidamente traz efeitos colaterais e risco para sua saúde, mas não quer fazer um tratamento por 2 ou 3 anos com um medicamento que pode estabilizar seu lado emocional e melhorar significativamente sua qualidade de vida, sem trazer maiores malefícios ao seu corpo. Ao contrário, este medicamento pode ajudá-la a reduzir os radicais livres e substâncias oxidantes acumuladas pelo estresse e proteger seu cérebro para a terceira idade. Isto por si só já seria um bom argumento!

Mas se a decisão de fazer ou não o tratamento fosse racional, a adesão seria de 100%. A pessoa precisa trabalhar internamente seus preconceitos e medos, se informar e conhecer melhor seu problema e refletir sobre o que será melhor para seu futuro para, então, tomar a decisão de se tratar. E mais: precisa manter este pensamento convicto diante dos primeiros sinais de recuperação, em que a inevitável sensação de cura pode demovê-la do tratamento, adiando sua estabilidade para daqui a dezenas de anos.

Possíveis complicações clínicas ou comorbidades

Algumas complicações, principalmente quando não há tratamento adequado, são bem conhecidas e devem despertar tanto para o diagnóstico como para o tratamento:

- dependência ou abuso de substâncias como álcool, café, cigarro, drogas ilícitas
- impulsos suicidas e impulsos auto-destrutivos (ferir-se, cortar-se, arranhar-se)
- compulsão alimentar
- ataques de pânico
- fobias
- psicose
- compulsão por compras, pelo jogo, por sexo, por computador
- déficit cognitivo e demências

Algumas doenças clínicas estão associadas com maior freqüência:

- Enxaqueca
- TPM
- Hipotireoidismo
- Hipertensão
- Síndrome metabólica (dislipidemia, diabetes)
- Obesidade
- Fibromialgia
- CA de mama

Diferentes apresentações clínicas

O estado misto de humor deve ser suspeitado diante dos seguintes quadros depressivos:

- Depressão ansiosa
- Depressão agitada ou hiperativa
- Depressão irritável
- Depressão psicótica
- Depressão com abuso ou dependência de substâncias
- Depressão com qualquer tipo de compulsão
- Depressão de curta duração (poucos dias) que se alterna com humor irritadiço ou eufórico/excitado: um exemplo comum – a pessoa está deprimida, mas tem dias ou determinadas horas em que se sente muito disposta, sai arrumando a casa toda, ou tem um rendimento superior à média dos dias anteriores. Depois volta a se sentir deprimida.

Portanto, se você se identificou com o artigo, não deixe de conversar com seu médico ou procurar um psiquiatra para ter uma avaliação do seu estado e iniciar um tratamento adequado. Boa sorte e que você alcance sua estabilidade em breve!

14 de outubro de 2010

Uma lição para todos!


O mundo emocionou-se com o resgate dos mineiros que ficaram presos na mina San José no Chile após 70 longos dias de espera. Foi um exemplo de superação, de fé e esperança e da solidariedade humana, que lamentavelmente anda esquecida nos dias de hoje.


Provavelmente a vida desses mineiros não será mais a mesma após este acidente. Conviverão com a lembrança dos dias de terror que passaram confinados a 620 metros de profundidade, passando por privações que nenhum ser humano imagina passar um dia. E de ter convivido constantemente com a possibilidade de morte, que nos primeiros dias parecia ser muito mais provável do que a sobrevivência.


Mas mesmo com todos os problemas físicos e psicológicos pelos quais ainda possam passar, o maior presente que tiveram foi ter a vida de volta. Isto faz com que tudo tenha um significado relativo. Eles mostraram ao mundo que a fé e a esperança são capazes de prolongar a vida e mudar o futuro. Certamente manterão o mesmo estado de espírito para superar as dificuldades, agora mais corriqueiras.


Acho que todos precisamos refletir mais a respeito. Do valor e do significado da vida, mesmo que passemos por turbulências, problemas e doenças, manter a fé e a esperança num futuro melhor é o ingrediente fundamental para a recuperação. Que a história dos mineiros possa nos ensinar muito a respeito da essência do homem, de seu poder de superação e, sobretudo, de fazer o bem ao próximo. A máxima (que já anda meio piegas) de que onde há vida ainda há esperança faz todo o sentido!
Veja o vídeo do momento mais emocionante do resgate: